O Grande Clássico do Violão Brasileiro

             A proclamação da república brasileira em 1889 marca o início de uma profunda mudança sociocultural onde os gêneros musicais, tais como conhecemos hoje, começam a se definir. A adoção das danças de salão de origem europeia, porém interpretadas pelo viés rítmico dos músicos nascidos no Brasil, dá origem a um gênero instrumental tipicamente brasileiro: o “choro”. No Rio de Janeiro, então a capital da nova república, é do choro que virão os primeiros solistas e compositores do violão. É nesse contexto que surge o primeiro compositor do violão puramente brasileiro: João Teixeira Guimarães, o João Pernambuco. 

                       João Pernambuco,  nasceu em Jatobá, interior de Pernambuco no dia 02 de novembro, de 1883, em uma família de 22 filhos e aprendeu música no sertão em meio aos violeiros e cantadores. Quando tinha 12 anos, seus pais mudaram-se para Recife onde aprendeu o ofício de ferreiro. Nessa época começou a fazer suas primeiras apresentações. Fascinado pela desenvoltura dos jovens cariocas que passavam por Recife, ele mudou-se para a capital quando tinha 20 anos onde desenvolveu sua carreira musical.  João Pernambuco foi um dos nomes mais importantes da música brasileira do início do século XX. Compositor, violonista e figura marcante do choro, deixou um conjunto significativo de obras que ainda hoje fazem parte do repertório de concerto, sendo referência fundamental para músicos e estudiosos do violão. 

              “Sons de Carrilhões”, um choro-maxixe, é justamente a obra que fez o nome de João Pernambuco ficar conhecido. O título da peça é envolto em mistério: carrilhão é um instrumento formado por sinos enfileirados, (normalmente 4) e o tema desta música tem 4 notas, mas pode ser também uma campainha com som de sinos. Já Turíbio Santos, um especialista na obra de João Pernambuco, afirma que esta música imita o som dos carros de bois ou “carrinhões”. A tonalidade da peça está em ré maior com a sexta corda afinada em ré, técnica que é conhecida como “scordatura”. A estruturada em forma ternária (A-B-A), típica do choro, podendo ocorrer variações de acordo com o intérprete. Apresenta frases bem delineadas, com uso recorrente de arpejos que exploram a sonoridade aberta das cordas do violão, criando um efeito de ressonância característico. A seção “A” trabalha com motivos curtos e repetitivos (4 notas), sustentados por uma harmonia clara e funcional, enquanto a seção “B” contrasta com movimento mais melódico e modulações sutis que enriquecem a progressão harmônica. 

                          Essa composição é uma herança direta da tradição do violão clássico europeu, tanto do ponto de vista da forma quanto da técnica.  Ela representa também uma contribuição significativa para o cenário cultural da época, pelo fato de João Pernambuco, até onde sabemos, ter inaugurado a forma de composição específica para violão no país. Tecnicamente, exige do intérprete um bom posicionamento das mãos direita e esquerda, apuro técnico de escalas e arpejos, precisão rítmica e um refinamento em termos de dinâmica para um equilíbrio do baixo, melodia e acompanhamento, aspectos que fazem da obra uma referência no estudo do repertório do violão brasileiro.

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